Victor Hugo Martinón
O veterano de guerra Victor Hugo Martinón

Por Luiz Reis*
Especial para o Poder Aéreo

A Guerra das Malvinas de 1982 envolveu muitos militares argentinos que cumpriram com o seu dever. Dos militares que sobreviveram à guerra e ainda estão vivos, muitos com terríveis cicatrizes físicas ou psicológicas, alguns estão dispostos a relembrar daqueles dias. Um desses veteranos é o senhor Victor Hugo Martinón, que gentilmente concedeu com exclusividade ao Poder Aéreo uma interessante e reveladora entrevista sobre aquele tenso período de conflito, enquanto servia como militar da Força Aérea Argentina (FAA).

PODER AÉREO – Qual é o seu posto na Força Aérea Argentina hoje e na época da Guerra das Malvinas?

Victor Hugo – Hoje eu sou Suboficial Mayor (R) VGM (Veterano da Guerra das Malvinas), mas na época da guerra eu era Suboficial Auxiliar. Exercia a função de Primeiro Fotógrafo-Navegador nos voos.

PA – Quais foram os aviões em que voou durante sua carreira militar?

Victor Hugo – Eu voei no FMA IA 35 Huanqueiro, Cessna 182, Douglas C-47, FMA IA 50 Guaraní II, Lockheed C-130 Hercules, Fokker F27, Helicóptero Hughes 500, English Electric Canberra, Boeing 707 e no Learjet 35A.

PA – Você serviu em quais unidades antes e durante a guerra?

Victor Hugo – Antes da guerra eu servia na II Brigada Aérea, no Grupo I de Aerofotografia, situada na cidade de Paraná, Província de Entre Rios, Argentina. Durante a guerra, além de continuar servindo no Grupo I também servi no Esquadrão Fênix, juntamente com o pessoal civil convocado.

PA – Quais foram as missões da sua unidade?

Victor Hugo – Antes do dia 2 de abril (de 1982, data de início da guerra) fizemos missões secretas de reconhecimento fotográfico e fotografia aérea, depois efetuamos missões diversas, de exploração, reconhecimento, guiagem de aeronaves de caça e bombardeio do continente para as ilhas, reabastecimento simulado, retransmissão de sinais de rádio e transporte de pessoal e material.

PA – Como era o dia-a-dia do seu esquadrão durante a guerra?

Victor Hugo – Da mesma forma como era nas missões anteriores à guerra, a Força Aérea nos preparou, voávamos seis horas por dia e recebemos instruções e práticas para a luta, a diferença durante a guerra era que tínhamos naquele momento um inimigo real.

PA – Quais equipamentos você operou?

Victor Hugo – Para as missões de aerofotografia usávamos câmeras cartográficas verticais, principalmente a Carl Zeiss 30/23 com filme Kodak Aerographic em Preto e Branco.

PA – Qual foi a missão mais perigosa que você participou?

Victor Hugo – Foi a missão em que fizemos a exploração e reconhecimento aerofotográfico no dia 19 de março de 1982 (antes da guerra) onde sobrevoamos secretamente a Ilha Gran Malvina e Port Stanley, sem os ingleses terem percebido. Nós também fizemos outra missão no dia 19 de abril, onde sobrevoamos diversos objetivos em ambas as ilhas, quando notamos a presença de fragatas inglesas sobre a área.

PA – Você estava escalado para a missão na qual um dos Learjet acabou abatido por um míssil Sea Dart inglês, no dia 7 de junho de 1982?

Victor Hugo – Não, eu teria que voar no T-24 (a aeronave abatida no ataque) no outro dia. Me salvei por um milagre, por um dia!

PA – Quais foram as condecorações que recebeu por participar da guerra?

Victor Hugo – Recebi a Medalha do Congresso da Nação Argentina, dentre outras condecorações.

PA – Como foi sua vida depois que a guerra terminou? continuou na Força Aérea?

Victor Hugo – Eu continuei com minhas tarefas habituais no esquadrão, depois fui transferido para a Direção de Aerofotografia em Buenos Aires e subsequentemente fui selecionado para a Agregação Aeronáutica Argentina nos Estados Unidos. Posteriormente fui designado para administrar o Aeroporto Internacional de Ezeiza, me aposentando definitivamente em 1997,

PA – Você acha que a Argentina ainda recuperará a soberania sobre as ilhas?

Victor Hugo – É o meu desejo.

PA – Que mensagem o senhor pode enviar às pessoas sobre o que aconteceu durante a guerra?

Victor Hugo – A Força Aérea Argentina nunca desistiu, as Malvinas sempre foram argentinas, nós, soldados, atendemos ao pedido do poder executivo nacional e cumprimos com o nosso dever!

Learjet 35A da FAA. Victor Hugo é o segundo da esquerda para a direita
Um Learjet 35A do Esquadrão Fênix da Força Aérea Argentina guiando um caça-bombardeiro IAI Dagger para as ilhas. A guiagem era necessária por causa dos melhores equipamentos de navegação do Learjet.

Medalha do Congresso recebida por Victor Hugo Martinón


NOTA DO PODER AÉREO: Agrademos a senhora Branca Soares, de Sorocaba-SP por gentilmente ter repassado o contato do Sr. Victor Hugo. Sem ela, essa entrevista não teria sido realizada.


*Professor de História no Estado do Ceará e da Prefeitura de Fortaleza, Historiador Militar, entusiasta da Aviação Civil e Militar, fotógrafo amador. Brasiliense de alma paulista, reside atualmente em Fortaleza-CE. Articulista com artigos publicados em vários sites sobre Defesa.

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Clésio Luiz

Não sei porque alguns brasileiros insistem em chamar as Ilhas Falklands de “Malvinas”. O território pertence legalmente ao Reino Unido, os moradores de lá se referem ao lugar por Falklands, não temos interesse nenhum lá e principalmente, não temos porque ter simpatia pela vaidade de um povo que claramente não tem por nós, vide o apelido racista de “macaquitos” à que se referem aos brasileiros.

Então vamos respeitar pelo menos a vontade dos habitantes do local e se referir ao lugar como se deve.

Leandro Costa

Concordo em gênero, número e grau.

Pangloss

Clésio, perdoe a divergência – e eu raramente discordo de suas postagens – mas o topônimo é irrelevante. O que importa é haver indicação clara do acidente geográfico identificado com determinado nome.
Chamar o arquipélago de Malvinas não demonstra simpatia por nenhuma causa.
“Turquia”, por exemplo, é um país que abriga diversas etnias – e os turcos foram os últimos a chegar lá.
“Holanda” é apenas uma parte do país que, em outros lugares, é designado como “Países Baixos”.
“Macedônia” é um termo que foi objeto de controvérsia com a Grécia.
E por aí vai…

Edson Parro

Olá Clésio Luiz
Eu não sei se há um motivo! Talvez um hábito? No meu caso é uma questão de gosto. Gosto muito mais da sonoridade de Malvinas! Esse outro nome aí, parece-me, ser muito “enrolado” para falar.
Da mesma forma que, normalmente, faço referência ao Reino Unido e não ao United Kingdon – desta vez há um motivo: a facilidade no falar e no escrever.
Sei lá, mil coisas…
Saudações

orivaldo

É mais fácil falar Malvinas. Falklands é muito difícil

Augusto Mota

Concordo plenamente, eu só chamo de Falklands, é o nome correto, e os ingleses ganharam a guerra no braço como homens, é deles e ponto final. Mas isso não quer dizer que eu tenha preferência pelos britânicos, pelo contrário, acho que por questões de logística e praticidade o arquipélago devia ser da Argentina, tenho certeza que só dá prejuíxo aos ingleses, além disso, o comércio natural é com a Argentina, o tempo de possessões ultramarinas acabou, a Inglaterra devia passar o controle aos poucos, pra mim a Argentina é a “herdeira” natural daquelas ilhas, se os kelpers quiserem ficar não… Read more »

Agnelo

Prezado
Não chamamos Alemanha de Terra do Alemão e nem Japão de Terra do Sol Nascente.
Sei lá… acho q mais fácil em português….
Sds

fewoz

Clésio, a sua visão dos argentinos é completamente fora da realidade. Pelo visto não conhece (de verdade) este povo e o que acham do Brasil. Recomendo que, antes de dizer tamanhas asneiras, pesquise mais, e principalmente, reveja seu preconceito. Durante muito tempo este tipo de coisa foi alimentada por Galvão Bueno e parte da imprensa, e o povo simplesmente comprou a ideia, generalizando de forma infantil e confundindo a rivalidade do futebol com todo o resto. A cultura, especialmente a música brasileira, é muito apreciada por lá (o inverso nunca aconteceu, não é mesmo?). Essa coisa de “macaquitos” é, muito… Read more »

Clésio Luiz

fewoz, quem sofreu o preconceito não acha que é inexistente. Não foi o Galvão que colocou isso na mídia, mas sim jogadores de futebol que ouvem (e ainda tem que aturar) as ofensas. Como elas não foram direcionadas à você pessoalmente, é fácil querer jogar para debaixo dos panos, dado seu envolvimento e interesse com o pessoal de lá. E é claro que muita ofensa não se diz na cara dos outros, mas não significa que ela não exista na mente das pessoas. Existem pessoas de boa índole por lá? Absolutamente. Mas não significa que não tenham falhas, afinal ninguém… Read more »

Clésio Luiz

E só para esclarecer, não tenho ódio ou rancor por eles ou pela população de qualquer outro país. Afinal, em qualquer local vai existir o bom e o mal, não posso condenar todos pelos pecados de alguns. Mas também não tenho uma visão rosada das coisas. Depois que aprendi língua estrangeira, sei muito bem que o que se fala na sua frente e nas suas costas são coisas bem diferentes. E por fim, não acho que devemos tomar as dores dos outros em coisas que absolutamente não nos interessam. Daí achar que chamar o local de “Malvinas”, só por causa… Read more »

fewoz

Olá, Clésio, obrigado pelo retorno. Ainda reitero que os brasileiros não são nada diferentes (muitos casos assim acontecem no Brasil). Já se atendo ao tópico, também acho que não devemos comprar a estúpida briga deles. Falta visão para os argentinos. Eles têm um milhão de problemas, mas preferem perder tempo insistindo com esse assunto de Malvinas. Perda de tempo, pessoal e dinheiro.

Kahuera

Eu ainda chamo a banda oriental de Cisplatina e a Argentina de Vice Reinado do Prata.

Fabio Araujo

Ele falou que entre as aeronaves que ele atuou estava o 707, não foi esse avião que quase causou o abate de um avião da Varig que foi confundido com um avião de reconhecimento argentino que estava sobrevoando a frota inglesa a caminho das Malvinas?

Leandro Costa

Sim, foi um 707 da Varig mesmo, se não me engano. Mas felizmente os protocolos de interceptação foram seguidos e a aeronave civil seguiu seu caminho. Os Argentinos utilizaram o que tinham à disposição. Não foi negligência deles, então eu acredito que eles não causaram nada.

Fabio Araujo

Parece que os argentinos estão querendo o apoio da MB na recuperação de alguns A-4AR Fightinghawk para ter pelo menos um esquadrão destes caças bombardeiros no ar. A Embraer e a MB tem experiência devido ao projeto de modernização dos A4 de nossa marinha. Mas eles vão ter grana para isso?

https://www.zona-militar.com/2020/04/01/el-futuro-del-a-4ar-fightinghawk-de-la-fuerza-aerea-argentina/

Flanker

O que a matéria diz é que os argentinos estariam buscando uma parceria com a MB para comprar suprimentos para o A-4 nos EUA.

Fernando XO

Flanker, para isso basta abrir um case no FMS… esse é o caminho… abraço…

Johnny

É mesmo, se já não tinham antes do evento covid 19, imagina depois disso. Outro grande empecilho é o boicote da Inglaterra que exerce influencia sobre outros países como os EUA. A tendência é eles continuarem a “experimentar” tudo quanto é vetor e ficar mesmo com os poucos super etendards que sobraram da guerra de 82, que no futuro receberão a modernização herdada da meia dúzia das versões adquiridas usadas da França, perto do limite da vida útil.

orivaldo

Quando não se envolve politica no meio, esse blog não tem pra ninguém. Parabéns pela matéria

Rccabral

Off Toppic: Agora no FlightRadar24.com, um KC2 (A330-243MRTT) da RAF, vôo RRR2728 (Registro ZZ334) desceu o Atlântico em direção as Malvinas e na altura de POA, reduziu a velocidade para 175 Kts durante 30minutos, provavelmente abastecendo outra aeronave e está retornando a todo vapor em direção a Ilha de Ascensão.

Jose Luiz

Parabéns poelo esforço em produzir este valioso documento oriundo de fonte primária com valor historico. Belo tralalho de historiador. José Luiz. Também licenciado em História.

Joao Moita Jr

Do jeito que estão as coisas financeiramente, com as penúrias que a Inglaterra vem passando, brevemente ficará bem difícil justificar a continuada ocupação das Malvinas.
Já conversei com diversos ingleses, Royal Marines entre eles, e os mesmos não possuem nem o mínimo de afeto pelas ilhas. Mais cedo ou mais tarde, por razões puramente econômicas e práticas as mesmas regressarão ao controle argentino.

Rinaldo Nery

Tem lógica…

Delfim

Há indícios de hidrocarbonetos na área, mas como não são explorados, a conta de se manter as Falklands é elevada.

fewoz

Prezados editores, acho que um comentário meu ficou retido aqui… Obrigado.

Renato de Mello Machado

Que eu me lembro,havia a possibilidade da Inglaterra passar o controle antes da guerra óbvio, para a Argentina.não sei onde li,isso.Mas depois do ocorrido, de quererem tira-los com um chute na bunda, os ingleses mudaram de opinião. Eu sempre achei que um dia, poderia ser convocado para lutar contra a Argentina.Foi um alívio vê-los de joelhos.e principalmente como o Brasil se comportou, na situação toda.