Sérgio Santana*

Há alguns dias, em 25 de julho, foi anunciado neste link, que o Ministério da Defesa da Polônia encomendou dois exemplares do vetor de alerta antecipado e controle aerotransportado Saab 340AEW&C, com entrega prevista para os próximos dois anos.

Embora inicialmente a versão específica do modelo encomendado não fosse revelada, pouco tempo depois tornou-se público que tratava-se do Saab 340B AEW&C, designado S100B Argus na Svenska Flygvapnet (a Real Força Aérea da Suécia, onde operou entre 1997 e 2009, quando foram substituídos pela versão aperfeiçoada S100D, conhecida também como ASC 890, que então passou a acomodar operadores de radar a bordo). Os dois exemplares encomendados – de registros c/n 340B-409 e c/n 340B-431 – terão na Siły Powietrzne RP, a Força Aérea da Polônia, o seu terceiro operador, considerando que já foram operados pelas Armas Aéreas da Suécia (onde eram conhecidos respectivamente como “100005” e “100006”) e dos Emirados Árabes Unidos (com as designações de serviço “1332” e “1331”), permanecendo nesta última de 2010 até dezembro de 2020, quando a mesma já havia recebido dois exemplares do Saab Global Eye, a mesma aeronave que substituirá os Saab 340AEW&C na Polônia em um futuro próximo.

As origens do Saab 340 AEW&C

Em 1977, o estudo “da Defesa Aérea Sueca para o Próximo Século” sugeriu o desenvolvimento local de um sistema de radar compacto o suficiente para poder ser acomodado em um compartimento da fuselagem de uma aeronave muito menor do que as normalmente utilizadas para alerta antecipado e controle aerotranportado.

Vale lembrar que no mesmo ano a Força Aérea dos Estados Unidos começava a operar o Boeing E-3 Sentry e a Força Aérea da União Soviética, tradicional inimigo da Suécia, já testava uma versão de AEW&C do seu cargueiro Ilyushin Il-76 “Candid”, que entraria em serviço na década seguinte como Beriev A-50, recebendo da OTAN a designação de “Mainstay”, embora os soviéticos operassem um vetor para este tipo de missão desde os anos 60, na figura do Tupolev Tu-126 “Moss”.

Contudo, uma solução viável para o estudo de 1977 só apareceria no outono de 1985, quando a empresa Ericsson AB recebeu uma diretriz do governo sueco para iniciar as análises de um sistema que seria conhecido como PS-890 — iniciais para PulsSpaningsradar, radar de pulso para vigilância, enquanto “890” é só uma numeração, dando sequência ao radares PS860 e PS870 — que seria promovido comercialmente como Erieye – o ‘olho da Ericsson’.

Um Fairchild Swearingen Metro III (designação militar sueca Tp88C) número de série 883 foi escolhido como banco de teste aerotransportado para o programa na primavera de 1986. Em setembro do ano seguinte, o turboélice Saab 340B foi selecionado como o vetor para o Erieye.

Para compensar o efeito aerodinâmico da instalação do compartimento de 9,7 m da antena acima da fuselagem, duas aletas foram instaladas na parte inferior da fuselagem traseira para melhorar a estabilidade lateral e atenuar a turbulência criada em torno da deriva.

Saab Gripen C e D junto a um Saab 340B AEW&C

O primeiro voo com a antena instalada ocorreu em 1º de julho de 1994, e a primeira aeronave, agora com a designação militar S100B Argus, foi entregue à Força Aérea Sueca em 1997. Todas as seis aeronaves totalmente operacionais foram entregues para a Força Aérea do país em até novembro de 1998, com o sistema completo sendo designado FSR 890 (Flygburen Spaningsradar, radar de vigilância aerotransportado 890).

A velocidade de cruzeiro durante a missão é mantida a mais baixa possível para economizar combustível e prolongar a duração do voo; essa velocidade lenta requer que a aeronave voe com o nariz para cima (“cabrado”) em um ângulo três graus. Isso, por sua vez, determinou que a antena fosse ajustada em um ângulo de inclinação em relação ao horizonte.

Tal como instalado no S100B, o radar Erieye não é capaz de detectar contatos para a frente e para trás da aeronave, pois seus feixes cobrem um ângulo de visão de apenas 150 graus para cada lado da aeronave. O Erieye é capaz de selecionar diferentes frequências de repetição de pulso Doppler dependendo do tipo de alvo que está sendo rastreado: média para alvos aéreos e baixa para alvos navais. É um radar de varredura eletrônica ativa, operando na banda S. A sua antena é composta por duas fileiras com 192 módulos de estado sólido módulos posicionados verticalmente e dividida em porções superior e inferior. O controle de oscilação dentro dos módulos permite que os operadores determinem a altitude dos alvos detectados.

Operadores de radar a bordo do Saab 340 AEW&C

Quando originalmente introduzido na Força Aérea da Suécia, o Argus da Força Aérea Sueca não carregava operadores de radar a bordo da aeronave. Um técnico de radar a bordo monitorava os sistemas, mas a imagem era transmitida via links de dados compatíveis com a OTAN para operadores de radar em estações terrestres. Em voo, suas órbitas padronizadas tinham “pernas” com extensão de até 100 km, com o lado do radar voltado para longe da direção da ameaça sendo colocado no modo de espera ou stand by. Conforme a aeronave faz uma curva no final da perna, o lado em stand by é ativado e o lado ativo reverte para o stand by; desta forma o uso de energia e a geração de calor são diminuídos e a potência total pode ser usada na direção de interesse. À medida que a varredura é gerada, os operadores de radar podem selecionar áreas de especial interesse para os feixes a serem concentrados nela, além de qual modo de varredura é mais adequado para cada tipo particular de alvo.

Saab 340 AEW&C
Saab 340 AEW&C – Foto: Alexandre Galante



Cliente estrangeiro

Além de futuramente ser operado pela Polônia e ter sido empregado na Suécia e nos Emirados Árabes Unidos, o Saab 340B AEW&C está em uso pela Real Força Aérea da Tailândia, que no segundo semestre de 2007 anunciou que iria assinar dois acordos separados para adquirir 12 caças Saab JAS 39C/D Gripen e dois S100B AEW&C mais um transporte Saab 340 padrão para atuar como treinamento de tripulantes e aeronave utilitária.

Todas as aeronaves foram entregues entre 2010 e 2012 e servem no Esquadrão 702 da Ala 7, Base Aérea de Surat Thani.

Características Técnicas

  • Propulsão: dois turboélices General Electric CT7-9B cada um gerando 1.870hp, acionando duas hélices Dowty de velocidade constante de quatro pás de 3,35 m de diâmetro.
  • Dimensões: Envergadura 21,44 m; comprimento 19,73 m; altura 6,97 m; área da asa 41,81 m².
  • Pesos: Vazio 8.225 kg; Máximo na decolagem 13.155kg.
  • Desempenho: Velocidade máxima 463 km/h; velocidade de cruzeiro ideal de 448 km/h a 7.620 m; velocidade de patrulha 300 km/h; teto de serviço 7.620m; alcance 2.858 km.
  • Aviônicos: Sistema de controle de vôo automático Rockwell Collins APS-85; Gravador de dados de voo Sundstrand; Alerta de proximidade do solo Lockheed; INS/GPS Honeywell H764G; ILS padrão TILDES; conjunto de rádios HF/VHF/UHF; interrogador Mk 12 IFF/SSR Modo 1 a 4.
  • Radar: Ericsson PS-890 Erieye AESA, pulso-Doppler com cobertura de área de 300º. Alcance tipicamente de 450 km contra alvos do tamanho de caças, 300 km contra navios de superfície e 150 km contra mísseis de cruzeiro voando baixo. Capaz de rastrear simultaneamente 300 contatos (voando em velocidade variando entre abaixo de 108km/h e até 3.600km/h), priorizar 100 deles e vetorar pelo menos 9 aeronaves simultaneamente por links de dados ou voz. Opera nos modos alerta antecipado estendido; rastreamento durante a varredura; aéreo; vigilância marítima; agilidade de frequência; exibição de seção transversal de radar do alvo; busca estabilizada no solo ou estabilizada na plataforma.


*Bacharel em Ciências Aeronáuticas (Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL), pós-graduado em Engenharia de Manutenção Aeronáutica (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC/MG). Colaborador de Conteúdo da Shephard Media. Colaborador das publicações Air Forces Monthly, Combat Aircraft e Aviation News. Autor e co-autor de livros sobre aeronaves de Vigilância/Reconhecimento/Inteligência, navios militares, helicópteros de combate e operações aéreas

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Mr.Guara

Desculpa se a pergunta não fazer sentido, Mas por que não usar balões ancorados para esse tipo de vigilancia em alta altidude? Eu entendo que o fator do peso da propria corda inviabilizava projetos nesse sentido no passado, mas hoje ja temos diversos materias e balões enormes suportando quantidade invrivel de carga (vide China). E vendo a guerra da Ucrania e o uso de AEW&Cs por diversas nações ao redor do conflito, muitas combrem um territorio quase que fixo, fazendo um voo em torno de um local. Um balão não seria mais barato de operar, e operaria por mais tempo… Read more »

Fernando Botelho

É uma boa pergunta.

Talvez seja útil em momentos de paz, mas em conflitos se tornariam alvos muito fáceis?

Imagino também que, no momento em que você tem um local para ancorar esse balão no chão, você já deve ser o dono da área em volta. Já o avião pode adentrar espaço aéreo que está além de seu território.

Willber Rodrigues

O problema é que esse balão, além de estar em um ponto fixo, teria um RCS bem grande, tornando bem fácil a tarefa do inimigo em derrubá-lo.
E por estar ancorado, seria mais fácil pro inimigo “prever” sua área de cobertura, toenando mais fácil contorná-lo.

Cansado

Além do que já foi colocado, também tem uma outra coisa: essas aeronaves carregam equipamentos complexos, caros e sensíveis.
Pendurar isso tudo num balão, parado num ponto fixo, fica meio arriscado.

Nilton L Junior

O Sergio que tal fazer um trabalho comparativos entre os AEW&C como o A-100, KJ-500 e E-7.

Sensato

Na medida em que me parece um sistema limitado em capacidades com relação aos mais atuais, seria uma solução interina até que possam obter sistemas melhores?

EduardoSP

2º§

Os dois exemplares encomendados – de registros c/n 340B-409 e c/n 340B-431 – terão na Siły Powietrzne RP, a Força Aérea da Polônia, o seu terceiro operador, considerando que já foram operados pelas Armas Aéreas da Suécia (onde eram conhecidos respectivamente como “100005” e “100006”) e dos Emirados Árabes Unidos (com as designações de serviço “1332” e “1331”), permanecendo nesta última de 2010 até dezembro de 2020, quando a mesma já havia recebido dois exemplares do Saab Global Eye, a mesma aeronave que substituirá os Saab 340AEW&C na Polônia em um futuro próximo.”

Sensato

Tem razão. Obrigado. Passei batido dessa parte.

Cicero

Olá a todos, Fiquei com algumas dúvidas sobre esse sistema e quem puder ajudar a esclarecer ficarei grato: Como se compara essa antena com as que equipam os nossos E-99? Ou elas são razoavelmente similares e a maior diferença é aquestão de software? Quando foi citado que quando “on station”, apenas o lado voltado para as ameaças é realmente utilizado. Isto é uma solução operacional ou uma limitação energética? Os nossos E-99 conseguem gerar energia suficiente ou usa a mesma estratégia do Saab 340? Pelo qque entendi o Erieye possui apenas visão lateral. Como essa limitação foi tratada no E-99.… Read more »

danieljr

5- Parceria entre a SAAB e a Bombardier no projeto. Deve ter outras melhorias devido ao projeto ser mais recente, mas, basicamente é isso.

Sérgio Santana

Respondendo às suas perguntas, Cícero: P: “Como se compara essa antena com as que equipam os nossos E-99? Ou elas são razoavelmente similares e a maior diferença é a questão de software?” R: A antena do Saab 340AEW&C é rigorosamente a mesma que a dos E-99 antes da modernização, inclusive o ângulo de varredura de ambas está limitado a 300 graus. P: “Quando foi citado que quando “on station”, apenas o lado voltado para as ameaças é realmente utilizado. Isto é uma solução operacional ou uma limitação energética?” R: É a resposta a um requerimento operacional, visto que na época… Read more »

Cicero

Muito bom.. sempre aprendo mais por aqui.

Rinaldo Nery

Se um AWACS não sabe de onde vem a ameça, está no lugar errado. Lembrando que, em conflito, ele não cruza a linha de contato, nunca. A geração elétrica AC para o radar, no E-99, provem da APU de 85 KVA.

Leonardo Gama

Quantos km atrás da linha de contato ele deveria voar para escapar da distância de engajamento de um sistema S-300?

Overandout

Estes avioes sao usados eu assumo, visto que a producao do SAAB-340 terminou ha algum tempo…

Fabio

Salve povo, o Praetor P600 AEW não seria uma opção melhor, mais atual e de menor custo do que esse modelo selecionado?