O piloto da USAAF, Capitão Bruce W. Carr, 20 anos, foi o único piloto conhecido a ir para uma missão voando um P-51 Mustang e retornar no outro dia voando um Fw190!

No dia 2 de novembro de 1944, ele estava em uma missão sobre a Tchecoslováquia, quando o fogo antiaéreo atingiu seu Mustang, Angel’s Playmate.

Densos vapores do líquido refrigerador do motor saíram pelos buracos e Carr teve que saltar de paraquedas antes que seu caça pegasse fogo. Depois de caminhar pelos campos, o faminto Carr tomou a direção de uma aeródromo alemão que ele havia avistado enquanto estava voando.

Ele decidiu ficar do lado de fora do aeródromo, escondido em uma floresta até a manhã seguinte, quando iria até a entrada da base para se render. Enquanto esperava escondido entre as árvores ele avistou um grupo de mecânicos alemães trabalhando em um Fw 190A-6 que estava bem próximo.

Carr percebeu que o caça alemão estava pronto para voo, quando os mecânicos colocaram de volta a carenagem do motor, abasteceram seus tanques, deixando o Focke-Wulf sozinho. Mais tarde ele admitiria que sua atitude fora mais como um impulso de uma pessoa faminta do que uma brilhante ideia.

Carr cuidadosamente esgueirou-se até chegar ao Fw 190 e passou o resto da noite no cockpit do caça alemão. Um pouco antes do amanhecer já havia luz suficiente para Carr estudar os instrumentos e os switches.

Cockpit do Fw 190

Olhando para o painel do caça, teve que aprender e adivinhar algumas coisas durante meia hora ou mais, encontrou uma certa dificuldade com os procedimentos de partida, que incluíam a alavanca de partida que tinha que ser empurrada ao invés de puxada.

Finalmente o BMW radial ganhou vida e Carr decolou entre dois hangares, ao invés de se arriscar taxiando até a pista. O Fw 190 de Carr voou rugindo sobre as cabeças dos atônitos alemães e fugiu com velocidade máxima até sua base em Orconte na França, distante 329,1 km.

Chegando lá, ele não sabia como baixar o trem de pouso, então simplesmente pousou de barriga em um campo, antes que a antiaérea da USAAF tivesse chance de abatê-lo. Anos depois, Carr costumava contar essa história para os seus netos quando estes perguntavam o que ele teria feito na guerra.

Bruce Carr, voava Piper Cubs como piloto privado desde 1938 quando se alistou em 1942. Ele solou um treinador Stearman com somente três horas de voo. Em Tipton na Georgia, a USAAF passou Carr para o P-40 e eles lhe disseram: “Vá voar!”. Carr explica:

“Eu tinha dezenove anos e pensava que sabia tudo. Eu não sabia o suficiente para ter medo. E eles não nos disseram o que fazer, disseram somente ‘Vá voar!’, então eu voava sobre a fazendas a baixa altura, zunindo sobre as vacas. Dezenove anos de idade e 1.100 hp: o que eles esperavam? Mais tarde fomos para a Europa.”

Fw 190

Carr tinha 160 horas totais de voo, incluindo 40 horas no P-40, quando ele foi para o P-51B. Quando começou a voar esse “hot fighter”, Carr apelidou seu P-51 de Angel’s Playmate porque dizia que os anjos estavam a 30 mil pés! Sua primeira vítima foi no dia 8 de março de 1944:

Depois que o seu líder de esquadrão alijou os tanques externos e tomou o rumo de volta, Carr permaneceu para lutar contra os Messerschmitts. Ele entrou em um combate em círculos com um tenaz piloto de BF 109G, nenhum conseguia acertar um tiro no outro, então foram descendo em uma espiral terminando o combate no topo das árvores.

Enquanto fazia curvas apertadas a poucos metros do chão o piloto alemão teve que subir para livrar algumas árvores e então Carr começou a atirar, sua empolgação era tanta que esqueceu de liberar a pressão sobre o gatilho, os canos de suas metralhadoras começaram a queimar. Ele relatou que um dos projéteis – um projétil traçante – saiu dando cambalhotas e fez um enorme arco, seus tiros acabaram atingindo a asa esquerda do BF 109. O piloto inimigo cabrou e alijou o canopy. Ele saltou, mas estava muito baixo para seu paraquedas abrir e o caça espatifou-se no chão, causando uma grande parede de chamas no ar, por onde passou o Mustang de Carr.

Carr disse que essa sua primeira vitória não foi realmente um abate mas sim, quase que um suicídio!

Uma réplica moderna em 3D do P-51 de Bruce Carr, ‘Angel’s Playmate’.

O “Bad-boy” Carr teve alguns problemas no seu primeiro esquadrão, o 380th FS, por ser “muito agressivo”, mas encontrou um lar no 354th FG, no qual tinha pilotos parecidos com ele. Glenn Eagleston (18 vitórias), do Grupo 353rd FS, era um dos agressivos oficiais comandantes que valorizavam sua atitude.

Bruce Carr teve 14 vitórias contra os alemães, nas suas 172 missões. No dia 2 de abril de 1945, Carr foi o último piloto de caça no Teatro Europeu a abater cinco aeronaves inimigas em um único dia.

Ele abateu três Fw190A pela manhã e dois BF 109G à tarde, próximo de Kronach Bayruth. Como resultado de fogo antiaéreo, ele teve que saltar de paraquedas três vezes. Surpreendentemente, Carr permaneceu na Força Aérea, apesar de seu comportamento no início da carreira e voou 51 missões no F-86 Sabre na Guerra da Coreia e mais 28 missões sobre o Vietnam, voando o F100 Super Sabre, porém, nessas guerras não abateu nenhum inimigo.

Carr saiu da Força Aérea como coronel em 1970 e seu Angel’s Playmate foi exposto em um museu francês em Paris, depois da Segunda Guerra Mundial. Seu Fw190A-6 “emprestado”, ficou no aeródromo em Orconte por um tempo e finalmente foi sucateado.

Vídeo: Partida de um Fw 190

Vídeo: P-51 Mustang e o característico som do motor Rolls-Royce Merlin

TRADUÇÃO: Roberto F. Santana / FONTE: Aces 2 by W. Wayne Patton – Squadron Signal Publications

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Leandro Costa

A curiosidade da primeira foto é que aquele Fw-190 foi uma aeronave capturada que foi avaliada pelos aliados. Essa foto, salvo engano foi tirada nos EUA, após tentarem restaurar sua pintura alemã. A suástica na deriva é grande demais em relação às marcas originais.

Tio Velho Comuna

Netflix poderia fazer um filme sobre isso!

pedro

Ninguem mais faz esse tipo de filme, agora é só super-heroi e no maximo filme de lacração, especialmente comedias romanticas, franquias ou ficções ridiculas.

Clésio Luiz

Nah. A história original é perfeita demais pra Hollywood. Eles preferem os casos mais simples, onde podem incluir a maior quantidade possível de erros históricos e exageros.

Leandro Costa

Vide ‘Red Tails’…. Horrooooooso heheheheh

Rinaldo Nery

Concordo.

Reinaldo Deprera

Nesse dia o Hitler mordeu o céu da boca dando cria e morreu no parto.

ZEUS

Official Kill Ratio:

P-51 11:1
FW-190 60:1

Sei que não precisa traduzir mas é divertido:
De cada 11 inimigos derrubados um P-51 era abatido.
De cada 60(sessenta!) inimigos derrubados, um FW-190 era abatido.

Maiores ases do FW-190 : Otto Kittel com 267 abates, Walter Nowotny com 258, Erich Rudorffer com 222, e por aí vai.

Maiores ases do P-51: George Preddy com 23 abates, John Meyer(meyer:alemão) com 21, e por aí desce..

Aeronave superior? Pilotos superiores? Parece que incontestávelmente ambas as coisas!

Leandro Costa

Até você analisar o contexto e ver o por que da discrepância. Número de abates não significa absolutamente nada em relação à aeronave ou treinamento dos pilotos. Tanto P-51 quanto Fw-190 eram aeronaves absolutamente magníficas, que tinham vantagens e desvantagens e eram ambas competitivas entre si. Comparar por abates é coisa de leigo. O 190 entrou em combate inclusive ANTES dos EUA entrarem na guerra, que dirá então quando o P-51A/Mustang mk. I entrou em cena com a RAF/USAAF, e não estou nem falando do A-36A. Tambem é importante saber que os Mustang inicialmente não foram usados para procurar e… Read more »

Victor Filipe

Ele vai ignorar os seus argumentos, vai falar uma baboseira e sair fingindo ser superior. mas a sua resposta é excelente principalmente pra quem quer saber mais.

pouca gente parece lembrar que muitos pilotos alemães estavam em serviço desde a guerra civil espanhola.

esquecem que os pilotos aliados (Americanos e Britânicos pelo menos) tinham uma alta rotatividade (salvo engano a cada 15 voos eles tinham um período de descanso)

os pilotos alemães principalmente nos estágios finais da guerra não tinham esse luxo

Leandro Costa

Eu sei. Infelizmente pela lógica dele, um piloto como Adolf Galland, com um total de 106 vitórias aéreas pilotando um Me-262, jamais deveria ter sido abatido pelo Capitão James Finnegan, com um total de TRÊS vitórias aéreas pilotando um P-47D.

Mas aconteceu. Galland foi sua terceira e última vitória aérea durante a Guerra.

Flanker

Os aviões alemães eram ótimos, mas quantos modelos de caças eles usavam? Monomotores, e em grande quantidade, basicamente o Fw 190 e suas variantes e o Bf 109 e suas variantes. Já os aliados, usavam os monomotores Spitfire, Hurricane, Typhoon, Tempest, Warhawk, Thunderbolt, Mustang, etc. Não citei m9del9s e versões embarcadas e nem os caças soviéticos. Logo, é óbvio que os alemães tenham maiores números de ases, pois concentram -se em poucos modelos, ao contrário dos aliados, divididos em muitos e muitos modelos diferentes.

LucianoSR71

Automaticamente me lembrei do grande piloto Bob Hoover famoso por suas acrobacias no Aero Commander c/ os 2 motores desligados – depois de travar uma longa batalha c/ a FAA voltou a pilotar e fez sua última apresentação c/ 77 anos em 1999. Durante a 2ªGM estava na sua 59ª missão voando um Spitifire quando este teve problemas no motor e ele acabou sendo abatido por um FW-190 no sul da França, depois de 16 meses fugiu de um campo de prisioneiros e retornou as linhas aliadas roubando um…FW-190. Depois da guerra se tornou piloto de teste e estava na… Read more »

Marcos10

Tem a história de um Ju-88 que veio para em Natal, seguindo depois para os EUA.

LucianoSR71

Desconheço essa história, mas provavelmente era um voo de translado p/ testes nos EUA. O Ju-88 foi a 2ª aeronave mais versátil da 2ªGM, só perdia p/ o DH98 Mosquito.

Leandro Costa

E você está correto em assumir que foi um vôo de traslado para avaliação nos EUA:

https://www.thedrive.com/the-war-zone/37574/how-this-nazi-recon-plane-ended-up-being-tested-in-the-united-states-during-world-war-ii

LucianoSR71

Amigo Leandro, gostei da matéria, valeu.

Mazzeo

A maravilha de madeira.
Mostra muito da inventividade dos britânicos durante a guerra.
Avião sensacional, fazia de tudo, de caça e caça noturno a bombardeiro, lançador de minas navais e até destruidor de represas.
Um dos esquadrões que opera os F35 ingleses no QE o 617 é o que operava os “Mossies” lançadores de minas anti represas.

Leandro Costa

Mazzeo, o 617th usava os Mossies mais como ‘Pathfinders’ ou seja, eles iam na frente dos Lancasters e jogavam iluminadores sobre os alvos que deveriam ser bombardeados para facilitar a pontaria. A aeronave de bombardeio do 617th era o Lancaster e foi com eles que realizaram a operação Chastise, o bombardeio das represas usando as bombas ‘upkeep’ projetadas pelo Barnes Wallis. Os Mosquito, foram uma das aeroanves que deveriam usar a ‘Highball’, do mesmo inventor, que eram basicamente grandes bolas (parecidas inclusive com bolas de golfe em tamanho família), que foram projetadas para serrem usadas contra alvos marítimos. Só que… Read more »

LucianoSR71

Eu sou suspeito p/ falar do DH98 Mosquito, sou fã dessa bela ave, mas tenho que corrigir uma informação: o bombardeiro que foi usado no ataque as represas do Ruhr na Operação Chastise em Maio de 1943 foi o Avro Lancaster, o Esquadrão 617 Dambusters chegou a operar c/ o Mosquito, mas só a partir de 1944. Creio que o que pode ter lhe confundido foi que o Mosquito foi usado na fase de testes de viabilidade da bomba saltadora criada por Barnes Wallis e vídeos desses testes podem ser facilmente encontrados. Sobre a versatilidade dele gostaria de citar 3… Read more »

Leandro Costa

Pensamos igual, Luciano e a sua resposta ainda conteve mais informações sobre a Maravilha de Madeira 🙂

LucianoSR71

Leandro, vc conhece aquela antiga coleção de livros da Renes? Tinha um sobre o Mosquito, o original Mosquito Wooden Wonder é da editora Ballantine’s e o autor Edward Bishop, eu tinha uns 13 anos e quase decorei o livro inteiro, rs. Toda sua história é fascinante desde a luta p/ Sir Geoffrey de Havilland poder tocar o projeto, passando por onde foi concebido – numa mansão em Salisbury Hall que anos antes tinha sido alugada pela mãe de nada mais nada menos que Sir Winston Spencer Churchill, depois de detalhar as plantas, o protótipo foi construído no maior cômodo da… Read more »

Leandro Costa

Luciano, tenho a coleção quase completa na casa do meu pai. E a operação para encher o saco do discurso de Goering e Goebbels fez aniversário na semana passada, se não me engano. O Mosquito também foi um dos primeiros modelos que montei (acho que era um Airfix, escala 1/72). Até o avião que se originou no Mosquito, o Hornet, era bonito também, apesar de ter ficado pouco tempo em serviço. Lembro de um livro pequeno que conta uma estória dos primeiros anos da Guerra Fria e um Mosquito salvador. O livro é ‘O Pastor’, só não lembro quem era… Read more »

LucianoSR71

Leandro, comprei muitos livros dessa coleção no sebo, tem um: ‘Japão a agonia final’ que conta c/ dados oficiais como a população japonesa estava passando fome, agravada pela prioridade de alimentar os soldados e os líderes militares simplesmente eram insensíveis a isto. O Hornet ( DH103 ) foi uma evolução do Mosquito projetado como um caça monoplace de longo alcance pensando no teatro do Pacífico e futura adaptação p/ uso embarcado ( viria a ser o Sea Hornet ), tinha uma série de refinamentos, motores Merlin c/ mais de 2000HP e asa c/ fluxo laminar, que permitiam chegar a quase… Read more »

Leandro Costa

Luciano, Mosquitos eram às vezes utilizados em SAR. Aeronaves retornando à noite, com avarias e perdidos (instrumentos com problemas), entravam em contato via rádio e um Mosquito saía para interceptar o contato radar com a aeronave perdida e guiá-lo de volta à Inglaterra. Acho que operou assim até alguns anos depois da Guerra. O livro na verdade é um conto fictício ‘sobrenatural’ mas é uma bela estória de piloto quando um Venom se perde à caminho da Inglaterra numa noite de inverno de 1951 ou ’52. E não conhecia o Albatross! Obrigado pela dica! Vou ler mais à respeito desse… Read more »

LucianoSR71

Agora entendi a história do pastor. Ter lhe apresentado ao Albatross, me deixa contente. Vamos ver se esse comentário não fica de castigo como quase todos os meus, inclusive o último e é logo publicado.

Leandro Costa

Normalmente também enfrento o mesmo problema com o Doberman! Heheheeh

Marcos10

Note-se que o cockpit era bem limpo.

Rinaldo Nery

Lendo o livro do Robin Olds, “Fighter Pilot”, descobri que, em 1944, a USAAF já voava em linha de frente tática, e já utilizavam o conceito de “sweep” (varredura). Robin Olds voou o P-38 e o P-51, na Inglaterra. Depois da guerra lá voltou para um intercâmbio, voando o F-8.

Leandro Costa

Ainda não li o livro do Olds, mas se ele estava descrevendo o que os caças da USAAF fizeram em 1944 para arrasar com a Luftwaffe e basicamente a economia de Guerra alemã, na qual os grupos de caça se revezavam para escoltarem os bombardeios, e quando chegavam no ponto de rendição por outro grupo, mergulhavam em leque buscando contato com o inimigo, e a esquadrilha que o fizesse alertava as demais que convergiam para o local. Sucessivas ondas disso deviam ser arrasadoras. Bolado por Jimmy Doolittle, ex-piloto de caça (e boxeador amador, e primeiro engenheiro aeronáutico dos EUA e… Read more »

Afonso

Eu amo muito o som do Rolls-Royce Merlin, hino para os ouvidos. Sonho em ouvir pessoalmente, quem sabe um dia. 🙂

Delfim

Lista dos 10 caças mais feios da 2WW, sem colocação.

PZL P11
Brewster F2A Buffalo
Polikarpov I-16
Fairey Fulmar
Blackburn Roc
Boulton Paul Defiant
Mitsubishi A5M
IAR 80
BF 109 versão E
Dornier Do-335

Flávio

Ao que parece, para ser um piloto combatente, não precisava ser desmiolado, mas na 2ww, eventualmente servia para descoberta de talentos.

LucianoSR71

Posso lhe fazer uma proposta de raciocínio reverso do que vc disse? Alguém que: se propõe a voar um caça num frio extremo que podia chegar abaixo de -50º ( não tinha pressurização ) por até mais de 3h indo ao um lugar onde vc sabe que vai ser alvo de todos os tipos de canhões antiaéreos, encontrará caças inimigos que exigirão o máximo de seu físico e mental p/ permanecer vivo, se for bem sucedido tentará voltar voando outras tantas horas, extenuado e talvez ferido encontrar sua base, quem sabe à noite, executar o pouso, saber que algum colega… Read more »