Um ano mais de espera não pode agravar o negócio, mas poderá servir para a conveniente higienização

Janio de Freitas

Mais do que confuso, ou deliberadamente mal explicado, o tal corte de R$ 50 bilhões nos gastos governamentais previstos para este ano juntou-se ao folhetim dos caças para formar a percepção de atos incorretos do governo anterior e do atual.

Para decolar com os caças, Guido Mantega: “Neste ano não há dinheiro para os caças”. Ótimo. Por numerosos motivos. Um dos quais, entre os importantes, é que esse negócio está submetido a tratamentos inaceitáveis desde sua fase inicial, há 12 anos, ainda no governo de Fernando Henrique. Um ano mais de espera não pode agravá-lo, mas poderá servir para a conveniente higienização.

Na mesma segunda-feira em que a sentença de Mantega fazia mais uma desautorização a Nelson Jobim -um ministro que já está pequenino de tantas vezes que sua autoridade foi cortada na história dos caças-, um discreto texto na “Gazeta Russa” trazia duas novidades sobre o negócio. Estava na “Gazeta Russa”, incluída na Folha em par com “The New York Times”. O jornalista Viktor Litóvkin informava que Brasil e Índia receberam da Rússia a oferta de participação no projeto de um caça de quinta geração, já em testes, com possibilidade de venda para terceiros. O Brasil ainda não deu a “resposta definitiva”. Aqui, o Ministério da Defesa não deu tal notícia.

A exclusão anterior dos russos, porém, ao que explicou Litóvkin, deu-se porque o Brasil exigiu a compensação de compra, pela Rússia, de jatos comerciais da Embraer equivalentes ao seu Superjet-100. Pode-se tomar a exigência como pretexto, porque os Estados Unidos tinham reagido à preferência dos testes técnicos da FAB pelos Sukhoi russos. A Rússia tinha restrições à plena transferência de tecnologia do seu jato então mais moderno, mas essa dificuldade não altera o fato de que o governo brasileiro montou uma concorrência desleal. Aos franceses, por certo, não foi exigida a mesma compensação, nem consta que o fosse aos americanos, cujo caça é também aprovado pela FAB, embora, em princípio, a ele preferisse o projeto conjunto com os suecos. Concorrência à brasileira, pois.

Em referência ao que seriam cortes propriamente, os ministros Guido Mantega e Míriam Belchior (Planejamento) limitaram-se a uma encenação de explicações e de entrevista coletiva. O corte mais gritante, por exemplo, que teria reduzido em R$ 5,1 bilhões a verba do programa Minha Casa, Minha Vida, serviu muito para notícias, mas não para cortar gasto. Os próprios ministros informaram que o corte refere-se à verba de uma medida provisória que nem está aprovada pelo Congresso: refere-se a uma nova etapa do programa que não seria desenvolvida necessariamente, neste ano, e só o seria, se o fosse, em parte. Ou seja, o gasto cortado não era gasto.

Com o aumento do funcionalismo dá-se o mesmo. Nem figurava no Orçamento, logo, a referência a sua exclusão neste ano é apenas retórica. O corte em investimentos já contratados do Ministério da Defesa também não é corte de gasto. É adiamento a ser negociado, o gasto continuará.

O corte dos R$ 18 bilhões acrescentados ao Orçamento por emendas de parlamentares, por sua vez, é mais nominal do que efetivo, porque as emendas de deputados e senadores dependem de liberações que, por tradição, ocorrem o mínimo possível. Mas tem, no caso, o aspecto positivo de confrontar os parlamentares e seus modos de manipulação do Orçamento dos três Poderes.

Belchior e Mantega ficaram devendo uma explicação ainda mais interessante. Incluíram R$ 3,1 bilhões de um corte a resultar de auditorias a serem feitas para identificação de fraudes nas folhas de aposentadorias, pensões e outras. Como sabem que o montante das irregularidades é aquele? E, se sabem, sabem também onde estão as fraudes, sem precisar de contrato com auditorias externas. Se não sabem e precisam das auditorias, agem incorretamente com a opinião pública e com o próprio governo.

FONTE: Folha de São Paulo, via Notimp

FOTOS: Sukhoi

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    11 Comentários
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    Está ai a chance de ouro pro Brasil, mas certamente deixaremos o bonde passar novamente.

    Vader

    Putz, postei ao mesmo tempo no Blog do Vader, rsrs. Na minha opinião Jânio de Freitas está redondamente enganado na seguinte assertiva: “Pode-se tomar a exigência como pretexto, porque os Estados Unidos tinham reagido à preferência dos testes técnicos da FAB pelos Sukhoi russos” Não houve teste da FAB com o Su-35 no âmbito do FX2. As avaliações operacionais das aeronaves, no FX2, apenas ocorreram após a seleção feita por meio da short-list, que excluiu LM F-16, Su-35, e EF-2000 da concorrência. Assim, não houve vôos de testes com o Su-35, pois as avaliações técnico-operacionais ficaram para a segunda fase,… Read more »

    Observador

    Como coloquei antes, este governo, como o anterior, joga apenas para a torcida, não para ganhar jogo. O FX-2 sofreu corte apenas e tão somente porque é mais impactante dizer que não vamos comprar aviões de guerra (assim mesmo, como é colocado para o povo), do que dizer que vai cortar no cafezinho, nas viagens e diárias, etc. Eles sabem que não haveria custo algum agora. Também sabem que a compra teria contrapartidas comerciais pelo país vendedor. Isto sem falar na prometida TOT, que concretizada, criaria empregos e fomentaria a indústria local. Ou seja, a compra se pagaria. Mas é… Read more »

    Wagner

    Termo de adesão da FAB ao programa de manutençaõ dos F 5 :

    item 37884 : NO SOVIET FIGHTERS !!!

    Rodrigo

    A probabilidade depois do Hind de vir algo da Rússia que não seja entubado é um nro muito próximo do 0.

    edcreek

    Olá,

    Se estamos cortando horas de voo vcs ainda falam em 5ºG da onde viria o dinheiro, puro devaneio, vamos de se tiver-mos sorte de F-5 jordania e talvez AMX-M.

    Abraços,

    Marine

    Depois de toda essa bravata que se foi dada ao END e todo falatorio de que “finalmente governo X estava encaminhando o reaparelhamento das FAs”, estarmos aqui hoje preocupados porque a FAB podera no futuro proximo ter nada menos que numerosos 35 cacas disponiveis para a defesa aerea do pais. Para o observador estrangeiro as FAs nao passam de forcas de seguranca interna em termos de suas capacidades e uso contemporaneo. Nao ha capacidade alguma para sequer a defesa do pais em cenarios militares modernos. Mais uma vez, foi so conversa fiada e a FAB continua a caminho de aeroclube,… Read more »

    Ivan

    Marine,

    Ruy Barbosa concorda com vc… ou vice e versa… 🙂

    É dele uma antiga frase, que continua atual:

    “Países que confiam mais em seu direito do que em seus
    soldados enganam a si mesmos e cavam sua ruina.”

    Sds,
    Ivan, o Antigo.

    asbueno

    Está no UOL destaque da presidente sobre o “píbão” de 7,5% para 2010. Está certo que não é apenas isso que vai fazer jorrar dinheiro por aí. Está correto, também, que se algo está ruim financeiramente, é melhor segurar ás rédeas do que soltá-las. Mas seria muito bom ser BEM mais claro (o governo) e honesto em relação aos cortes. Já dito muitas vezes aqui sobre não haver desembolso na eventual compra de caças neste momento. Então a decisão é política, talvez até para “manter as aparências”. Mas que aparências? A de um país desequilibrado, onde a economia formal está… Read more »

    Renato Oliveira

    Ivan, o Antigo, encerrou a discussão. Apoio 101%

    Baschera

    Certa ou não, a matéria joga algumas luzes sobre o FX…. qualquer um deles…. : É um processo totalmente viciado….. que já nasceu torto, manco e se tornou cego, podre e fétido…..

    Não me causa nehum espanto que, como nação, não sejamos sequer capazes de realizar um processo seletivo ilibado, correto e livre de causas que não sejam as reais necessidades das FFAAs e do país.

    Passar um sabão com desinfetante não bastaria….. o processo ainda estaria torto e manco.

    De Gaulle tinha razão…..

    SDs.