Sem voar há 8 anos, avião-laboratório do Inpe será doado à FAB

17

Por Maurício Toffani – Editor do Site Direto da Ciência

Há oito anos desativado e estacionado à beira da pista do aeroporto de São José dos Campos (SP), o avião-laboratório do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) está prestes a ser doado para a Aeronáutica. Custos elevados de manutenção e pareceres jurídicos contrários a realizar esse tipo de despesa foram os principais motivos para a direção do instituto optar por desativar seu Bandeirante, que realizava missões científicas de sensoriamento remoto e coleta de dados atmosféricos.

“Em 2012, o custo total para a manutenção foi orçado por empresas especializadas em montante superior a R$ 2,5 milhões, enquanto o valor da aeronave era estimado em aproximadamente R$ 600 mil”, afirmou em nota a direção do Inpe sobre o Bandeirante EMB 110 B1, que foi fabricado pela Embraer em 1980, adquirido em 1981 pelo instituto e agora está coberto de poeira.

A comparação entre esses valores, no entanto, foi criticada por pesquisadores do Inpe.

“Não dá para comparar o valor desse avião com o de uma aeronave qualquer”, disse Paulo Cesar Gurgel de Albuquerque, engenheiro cartográfico aposentado desde março de 2016. “O que perdemos, na verdade, foi um laboratório especializado em aerolevantamento e aquisição de dados sobre clima, ambiente, cartografia e outras áreas, inclusive simulação e ensaio de sensores”, acrescentou.

“O Bandeirante não era só do Inpe. Ele ajudou a integrar trabalhos de várias instituições brasileiras e também do exterior”, disse um pesquisador do instituto sob condição de anonimato, que destacou a participação do avião no Experimento de Larga Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA), um grande projeto internacional que envolveu mais de 300 especialistas da América Latina, da Europa, Israel Austrália e Estados Unidos.

Ao relento
Enquanto esteve em operação, de 1981 a 2009, o Bandeirante do Inpe “dormia” em um hangar do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), da Aeronáutica, que, segundo a direção do instituto, posteriormente necessitou do local para outra finalidade.

O Inpe informou que, após estudos e reuniões com pesquisadores e usuários em potencial, iniciou processo no primeiro semestre de 2015 para a doação da aeronave, que, em fevereiro de 2016, já estava disponível no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), do governo federal, para possíveis interessados. em dezembro, o DCTA manifestou interesse.

Em nota, o DCTA informou que o objetivo do Comando da Aeronáutica é “transferir a aeronave Bandeirante EMB 110, prefixo PP-FFV, para o Parque de Material Aeronáutico da Lagoa Santa (PAMA-LS)”. Entre as atribuições desse centro da Força Aérea Brasileira está a manutenção de aeronaves.

Prejuízo para a pesquisa
A Consultoria Jurídica da União (CJU) passou a recomendar a doação da aeronave devido aos altos custos de manutenção, ressaltou a nota do Inpe, acrescentando: “Em 2015, uma revisão completa foi estimada em cerca de R$ 5 milhões e implicava na desmontagem das turbinas e recondicionamento de vários subsistemas do avião”.
A Embraer deixou de fabricar o Bandeirante em 1995. No entanto, mesmo em países ricos, aeronaves fora de linha são mantidas para pesquisas. É o caso do Douglas DC-8 e do Lockheed P-3B, da Nasa, que com o avião-laboratório do Inpe participaram do LBA.

A desativação do Bandeirante inviabilizou várias iniciativas de pesquisa do Inpe e de outras instituições, que para terem continuidade passariam a depender de contratações de serviços com custos elevados, e demora nas licitações, sem falar na burocracia para isso. “Era tudo mais rápido e com baixo custo quando se podia contar com nosso avião-laboratório”, afirmou Gurgel.

O prejuízo devido à falta do Bandeirante do Inpe para a pesquisa do clima e do meio ambiente em geral tem sido inestimável, segundo o físico Paulo Artaxo, da USP, que foi um dos coordenadores do projeto LBA. O avião-laboratório possibilitava vôos a baixa altitude, proporcionando excelente condições para captação de dados atmosféricos e com uma boa relação custo-desempenho, afirmou o pesquisador, que é membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), integrante do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC) e um dos pesquisadores brasileiros de maior projeção internacional.

“O Brasil tem cerca de 7.500 quilômetros de costa e conta com cinco navios oceanográficos. Não dá para um país como o nosso, com uma área de mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, deixar de ter uma plataforma de pesquisas como esse avião”, disse Artaxo. Ele e alguns pesquisadores do Inpe acreditam que a FAB poderia restaurar o Bandeirante e, dentro de uma boa relação custo-benefício, fazê-lo voltar a ser o laboratório que era. Afinal de contas, dizem eles, a aeronave tinha poucas horas de vôo para a idade que atingiu.

FONTE: Direto da Ciência

Subscribe
Notify of
guest

17 Comentários
oldest
newest most voted
Inline Feedbacks
View all comments
Carlos Crispim

Noutro dia li a definição do brasileiro, que é perfeita: “a cultura brasileira é anti-cientifica e pró-comercial/mercantilista”. Educação e pesquisa são coisas não valorizadas e sem importância, o brasileiro quer é dinheiro, de preferência fácil e sem trabalho, por isso tanta gente joga em loterias.

Jr. Barros

Concordo com suas palavras, Carlos Crispim. A expressão:” trabalho duro”, não faz parte de boa parte do vocabulario dos brasileiros.

Marcelo Andrade

Olha Crispim,

Sou obrigado a concordar com esta definição! Educação, Pesquisa e Desenvolvimento são despesas!!!

Salomon Weetabix

Quando ele parou? 2009? Ah….entendi.

Braulio

A manutenção geral em 2012 era 2,5 milhões de reais, em 2015 era 5 milhões.
Em 2017 já deve estar em 8 milhões.
O DCTA vai reformar a aeronave e coloca-la no inventário da FAB?

Drferr

Um colega chama o brasileiro de Gerson Macunaíma, o cara que quer se dar bem em tudo, mas tem aversão ao trabalho.

Jose Norberto

Quando o Brasil ira’ entender que Educação, Pesquisa e Desenvolvimento são investimentos e não despesas?

kfir

hoje na moderna administração toda empresa tem de ter um departamento P&D, caso contrário corre o risco de morrer, da menor até a maior…

Miguel Felicio

Não vou dizer que sou obrigado a concordar com as opiniões anteriores, mas vou concordar sim, somos culturalmente atrasados e ou mais, ANALFABETOS………por essa e outros estamos assitindo os acontecimentos de hoje.

Carlos E. Goes

Carlos Crispim, Infelizmente concordo plenamente contigo. O Brasileiro não tem uma cultura de inovação e pesquisa cientifica. Não é prioridade nem para o povo em geral e nem para os governantes. O brasileiro médio esta mais interessado em futebol, praia, Carnaval e principalmente no próprio ego e na próxima festa do final de semana. Nosso povo cobra tudo de graça (saude, educação, segurança, emprego, aposentadoria) mas não esta disposto a fazer a sua parte, pois esperam que um governante milagroso caia do céu e resolva no estalar dos dedos todos nossos problemas. Bem vindos ao Brasil do futuro, um país… Read more »

Hipolito Brandao Nina

No Brasil o descaso com a educaçao nao e uma consequencia mas um projeto.

Antonio Palhares.

A paranoia antropológica, da qual somos oriundos. A cultura do privilégio do ibérico, a cultura da magia do africano e a cultura da indolência do indio. Deu nisso. Enquanto se gastava dinheiro fornecendo kits gays para crianças da rede pública, e’ negligenciado o ensino de exatas. Muita papagaiada e muita corrupção. Vejam os números destas manutenções.

sergio ribamar ferreira

Sr Carlos Crispim. Parabéns. Disse tudo. Fui professor e sei o que é isso.

Léo Barreiro

Só não entendi uma coisa…. Desculpa a minha ignorância… O INPE não tinha dinheiro para manter (certo?) E só agora que saiu a documentação para a doação? Pelo amor de Deus!!! Pior do que não ter dinheiro é essa burocracia brasileira que só nos dá prejuízo!!! Não seria melhor instalar os instrumentos em uma aeronave mais nova? Pq esse avião msm revitalizado já não seria muito velho? Meu medo é perdermos pessoal, e os instrumentos nele instalados…

Do mais concordo com o que o pessoal dos comentários anteriores escreveram…

Eduardo Farias

“a cultura brasileira é anti-cientifica e pró-comercial/mercantilista”
Tanto a cultura quanto a ciência no Brasil são estritamente estatais… Em países onde a cultura é realmente pró-comercial/mercantilista, você tem museus aeroespaciais, prêmios nobeis, empresas que fazem foguete decolar e pousar sozinho…

Rinaldo Nery

O copiloto que voava esta aeronave voa hoje na Azul. Além de voarmos juntos, esteve na minha casa. O INPE deixou as revisões da aeronave vencerem, para depois licitar as revisões . Quem conhece a Lei 8.666 sabe que é muito difícil pro administrador público, por vezes, realizar um serviço simples. São muitas regras e muita burocracia. A lei é muito engesssada. Não há como saber o valor da revisão sem efetua-la, pois, durante o serviço, o mantenedor vai verificar a condição da aeronave e dos seus equipamentos. Nem sempre, em aviação, será uma questão de cumprimento de TBO (Time… Read more »

Quintella

Concordo com o Carlos Crispim!